quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Brasil Novo?

Diretor e roteirista de "Apenas Heróis" é agredido por três homens e torna-se mais uma vítma da intolerância

Via: http://apenasherois.blogspot.com/

Justamente por ser o blog de "Apenas Heróis" um espaço onde sempre se impera a sinceridade sobre os acontecimentos que permeiam a produção, utilizamos este local para esclarecimentos.

No domingo, 21 de novembro, o diretor e roteirista de "Apenas Heróis", Daniel Sena, foi vítima de violência proxímo a sua residência, quando foi atacado por três homens que sairam de uma Saveiro estacionada numa alameda. Imediatamente os envolvidos, o renderam e o levaram para um matagal onde aos gritos de "viadinho", "gay de merda" e outras coisas, fizeram com que este comesse terra e bebesse um copo de gasolina - segundo os agressores, para limpar a boca. A todo instante gritavam se ele teria coragem de continuar a escrever e dirigir um trabalho assim e ameaçaram introduzir um pedaço de ferro em seu ânus, para que ele pudesse ver como era bom ser gay. Toda a ação durou pouco mais de 10 minutos. Ajudado por um caminhoneiro que passava pelo local, ele foi para casa onde foi medicado e em seguida tomou as providências necessárias.Hoje, segunda-feira, 22 de novembro, pela manhã, ele foi ao hospital fazer exames especificos para assegurar a saúde.

Agora calmo e tranquilo, ele pretende voltar suas atividades, no dia 24. Em que sociedade estamos vivendo? Que mau faz uma produção que só passa bons valores, que dá visibilidade a pessoas que trabalham e tem talento? Que não fere a ninguém? Qual direito estes jovens tem de ferir, agredir ou humilhar pessoas que levantam bandeiras de paz? A indignação é muita, mas a certeza de que a justiça de Deus é a mais correta de todas, esperamos, pois as dos homens, é dificil de confiar e acreditar - visto as dificuldades de se fazer um simples boletim de ocorrências.

"Estou reunindo forças e coragem para continuar, isso é uma certeza," comenta Daniel, em relato a esta jornalista.

Rafaela Rodrigues - Jornalista

Brasil Novo

Autor: Eduardo Maskell
http://eduardomaskell.blogspot.com/


Quando manchou o manto verde
O sangue português, chamou-se
Brasil a toda água que aqui fosse
Fonte. Pisou-se na terra, subiu-se
Ao monte e gritando a guerra, à
Guerra! Roubaram pedra a pedra
Nosso brilho mais distante. Nossa
Riqueza que não dava provas o
Diamante. Ouro de cor amarela,
Somente. Que por isso seria belo,
Semente sem vermelho valor do
Fruto podre que nos vende. Ah,
Portugal! Como minha alma te
Ressente! Depois de ter sentido
Mal, sentido mais! Na pele nua
Teu sabor de Alcatraz. Repudiosa
Nau que te guiaste à paz da minha
Secreta vida harmoniosa. Selvagem
Amor e ódio que tu desconhecias,
Sacrificante povo, renunciante à
Mais real e triste alegria. De viver
E matar para a alma comer. Para a
Honra do guerreiro não só honrar:
Mas ser. Coragem que foi de ti há
Muito vendida. Por medo guardada
Em segredo e esquecida. Neste fundo
Mistério de tua História onde também
Há de ressentir outra a tua alma cristã
Mas culpe então a Deus, não a Tupã!
Pela desgraça do peito teu. Da cruz
Que tua mentira reluz branca. Tua
Roupa rasga enfim e vê ser tua raça
Minha irmã. E a sífilis do teu falo
Mais enoja que inveja. Branca fé,
Aqui te cuspo! Meu espírito pagão
Ainda guarda a chaga da escravidão
Do negro susto! Que agora somos
Animais fugitivos do teu abandono
Filhos bastardos da Nação. Brasil,
Rima parda e negra para mão vil
Sujamos o teu nome, nosso Brasil!
Por não poder nossa pele escolher
Ser branca, limpa deste teu sofrer
Brasil! Não te quero casto, reto
Livre do teu passado mais certo
Mas em ti quero ser livre! Quero
O direito de ser teu filho. Amar-te
Não pelo dever. Com a liberdade
Saudar todas as suas cores, todos
Os seus sexos. Todos os amores
A Deus e contra Ele o protesto.
Brasil de todos os pais, de todas
As mães, Brasil de mamãe Oxum
Brasil ateu, de mãe e pai nenhum
Mas Brasil brasileira. E brasileiro
Seja de todos o teu presente, seja
Sonho o que vem pela frente, mas
Seja sonhar a realidade. Pela paz,
Pelo futuro que teus lábios beija,
Busquemos o novo e muito mais!

domingo, 21 de novembro de 2010

Nunca deixe seu filho mais confuso que você

Autor: Lourenço Diaféria

De manhã, na copa. O pai mexe o café na xícara. O filho caçula vem da sala, dispara:

— Pai, o que é genitália? O homem volta-se:

— Ge... o quê?

— Genitália.

— Onde é que você tirou isso, da sua cabeça?

— Tá no jornal, pai.

— Genitália, no jornal? Bem, esse assunto não é comigo agora. Já estou atrasado pro trabalho. Cadê sua mãe? Rita! Ritinhaaaaa! Onde é que essa mulher se enfiou? Rita, venha ouvir aqui o que seu filho está aprontando.

Dona Rita desce esbaforida:

— Algum problema, Gervásio?

— Problema nenhum. O garoto está apenas querendo saber o que é genitália. Explique pra ele. Estou de saída.

— Genitália? Eu? Isso é conversa de homem pra homem. Vai dizer que você não sabe?

— Saber eu sei, lógico. Mas há coisas que a gente sabe o que é na teoria, mas fica difícil de explicar na prática.

— Deixa de bobagem.

— Tá bom. Depois, se eu pegar trânsito, quero só ver.

— Pode deixar, pai. Não precisa ficar discutindo você e a mamãe por causa de uma palavra. Eu pergunto pra tia da escola.

— Tá louco? A tia pode pensar mal da gente. Deixa comigo. Presta atenção: genitália é o mesmo que partes pudendas. Genitália é uma coisa muito antiga. Já existia no tempo do seu bisavô. No século passado, quando seu bisavô estava vivo, as pessoas tinham pudor. Elas ocultavam do público certas partes do corpo. Chegavam até ao exagero. As partes que ficavam mais resguardadas formavam, exatamente, a genitália. A genitália eram as partes pudendas.

— O umbigo era genitália, pai?

— Não. Na verdade, não era. Vou tentar explicar melhor. As pessoas tinham vergonha de mostrar o corpo. E uma certa parte do corpo era reservada ao extremo. Não aparecia nem em filme francês. As pessoas chamavam esse território misterioso de vergonhas. Isso é que é a genitália moderna.

— Bumbum é genitália, pai?

— Não. Acho que não estou sendo muito claro. Ritinha, você não quer dar uma mão?

— Não. Assuma.

— Bom, vou pras cabeças. Ahnnn. Hummmm. Abaixe as calças. Mais. Até os tornozelos. Isso. Pronto, tá aí a genitália.

— O umbigo?

— No térreo do umbigo. Que é que você vê embaixo do umbiguinho?

— Pô, pai. Vai dizer que o senhor não sabe o que é isso? É meu bingolim, pai.

— Ta aí. O bingolim é a genitália do homem.

— Puxa, o senhor podia ter falado antes.

— Na vida, às vezes é preciso usar eufemismos. Por exemplo, a genitália da mulher tem um nome delicado, leve, ágil. Sabe o que estou querendo dizer, não sabe? Começa com b.

— Barata da vizinha?

— Não, filho. Borboleta.

domingo, 14 de novembro de 2010

Neocons à brasileira

Via http://www.cartacapital.com.br/

Autora: Cynara Menezes

Ao tomar a hóstia em Aparecida, beijar o terço em Goiânia e erguer como uma taça a imagem de Nossa Senhora da Abadia, em Uberlândia, o tucano José Serra não apenas bajulava o voto do eleitor cristão em campanha, mas selava o próprio destino. Identificado com a esquerda durante toda a sua vida política, Serra sai da eleição como a cara mais visível de um movimento que pretende fincar as raízes do ultradireitismo no Brasil. Espécie de versão brazuca do americano Tea Party, a nova direita que emerge das urnas pauta-se menos pela austeridade nos gastos governamentais e mais por uma moral retrógrada e um nacionalismo infantil que geralmente descamba para o preconceito.

Nos Estados Unidos, o Tea Party surgiu em 2009 a partir da constatação feita por um grupo de políticos conservadores, liderados pela ex-candidata a vice e ex-governadora do Alasca Sarah Palin, de que parte da classe média branca do país perdera privilégios ao longo dos anos – e, mais ainda, com a eleição de um negro, Barack Obama, para a Presidência. O ódio e o preconceito dessa fatia do eleitorado já haviam se manifestado na primeira eleição de George W. Bush, em 2000, quando uma massa de branquelos do Meio-Oeste foi às urnas contra propostas de liberação do casamento gay e do aborto, associadas aos democratas. Foi esse grupo um dos responsáveis pela vitória de Bush Júnior. A mesma turma alçou Palin ao estrelato e reduziu o espaço dos moderados no Partido Republicano.

Não à toa, o movimento Tea Party apoia a lei em vigor no Arizona desde julho- que permite prender e expulsar imigrantes pelo simples fato de não estarem de posse de documentos. Aqui, as vítimas da versão brasileira dos red necks são os nordestinos, a quem se “culpa” pela vitória de Dilma Rousseff no domingo 31.

Disfarçada na política, a aversão aos nordestinos invadiu as redes sociais, sobretudo o Twitter, na segunda-feira 1º de novembro, na manhã seguinte à confirmação da vitória de Dilma. Uma estudante de Direito de São Paulo, Mayara Petruso, deu a senha para uma enxurrada de manifestações preconceituosas ao postar a seguinte mensagem: “Nordestisto (sic) não é gente, faça um favor a SP, mate um nordestino afogado!” Seguiram-se dezenas de outras, todas no mesmo tom: “Trocaram voto por miolo de pão!”, “Valeu Nordeste, mais quatro anos vivendo às nossas custas”, “80% do Amazonas votam na Dilma… cambada de índio burro”, e coisas do gênero.

Mayara acabou alvo de uma representação movida pela seção pernambucana da Ordem dos Advogados do Brasil no Ministério Público Federal por racismo (pena de dois a cinco anos de detenção, mais multa) e incitação pública de prática de crime. Houve reação no próprio Twitter contra as mensagens preconceituosas e em defesa da população do Nordeste, mas foi incapaz de reduzir a onda antinordestina. Em entrevista ao portal Terra, uma representante do autodenominado Movimento São Paulo para os Paulistas chegou a afirmar que as críticas às mensagens sórdidas eram uma tentativa de “vitimizar o Nordeste”.

A enxurrada de mensagens preconceituosas foi também a demonstração de ignorância e desinformação. O argumento de que foram os nordestinos os responsáveis pela vitória petista não se sustenta pelos números: a ex-ministra seria eleita mesmo sem os votos do Norte e Nordeste. Se fossem computados apenas o Sul e o Sudeste, teria 29,7 milhões de votos, contra 29,4 milhões de Serra. Na capital paulista, de onde saíram muitas das mensagens ofensivas contra os nordestinos, Serra ganhou apertado, com apenas 466 mil votos de diferença. Perdeu feio em dois estados do Sudeste – Minas Gerais e Rio de Janeiro. Na terra de Aécio Neves, Dilma abriu vantagem de 17 pontos porcentuais, o que praticamente anulou a dianteira de Serra em São Paulo. No Rio, a petista obteve 4,9 milhões de votos, contra 3,2 milhões de Serra.

No Rio Grande do Sul, a vitória do tucano foi ínfima: pouco mais de 100 mil votos. Os estados do Sul e Sudeste onde- de fato o candidato do PSDB derrotou a futura presidente com folga foram o Paraná, com margem de 700 mil votos, e Santa Catarina, com vantagem final de 473 mil. Serra obteve vitórias esperadas em estados movidos pelo agronegócio, em queda de braço com o governo Lula em virtude da desvalorização do dólar. Assim como também era esperada pela oposição a larga vantagem da candidata do presidente no Nordeste: Dilma teve 18,4 milhões de votos na região, contra 7,6 milhões. Nem por isso, Serra pode ser considerado o candidato dos ricos, como não se pode desqualificar o eleitor de Dilma, praxe em editoriais e artigos na imprensa na semana pós-segundo turno.

Infelizmente, é inegável que foi a campanha do PSDB a estimular essa diferença, mais do que qualquer frase de Lula a cerca dos “nós contra eles”. Mergulhado até o pescoço na estratégia religiosa, antiabortista e impregnada de preconceito imaginada pelos artífices de sua exposição marquetológica, Serra deu o tom do embate entre paulistas e o resto do País no encontro da RedeTV! em 17 de outubro. “Essa estratégia de falar mal de São Paulo foi reprovada”, disse o tucano. E foi além ao declarar que “o PT não gosta de São Paulo”. Uma semana antes da eleição, o PSDB distribuiria panfletos com a frase “Dilma não gosta de São Paulo”, mesmo título do vídeo postado no canal oficial do candidato no YouTube. Ambos afirmavam que a petista “prejudicou São Paulo durante sete anos”.

Nos jornais, colunistas e editoriais davam a sua colaboração para que o preconceito contra os nordestinos viesse à tona. Por um lado, desqualificava-se a vitória de Dilma como representativa dos votos “menos conscientes” em contrapartida à racional escolha dos “mais escolarizados” pelo PSDB. Uma colunista chegou a escrever que Dilma e o “lulismo” só venceram a eleição “graças à votação maciça nas regiões e áreas mais manipuláveis, onde a Arena, o PDS e o PMDB já foram reis”. Daí aos “ricos” do Sudeste e Sul se jogarem contra os “pobres manipulados” do Norte e do Nordeste foi um pulo.

Professor de História da Universidade Federal do Rio Grande do Norte e autor do livro Preconceito contra a Origem Geográfica e de Lugar (Ed. Cortez), Durval Albuquerque Jr. diz que a questão é justamente o contrário do que dizem os analistas. “Não se votou em Dilma no Nordeste porque se sente fome, e sim porque o governo fez o povo comer”, argumenta. “Enquanto o País crescia a 4% ao ano, o Nordeste crescia a 8%, 9%. Houve uma inclusão imensa, que se reflete na votação maciça que o PT teve na região. O Bolsa Família não é alienante, como se diz, é o inverso: conscientizou as pessoas, fez elas se sentirem gente e passarem a exigir mais.”

O resultado é que mesmo entre as classes médias do Nordeste existe hoje o preconceito observado no Sudeste e no Sul, alerta o professor. “Eles queixam-se de que já não se contratam empregados com tanta facilidade, pagando qualquer coisa.” O historiador conta que o preconceito contra os nordestinos em São Paulo surgiu na década de 1920, quando começou a migração interna e os baianos foram os primeiros a chegar – por isso até hoje “baiano” é a forma genérica de se referir ao nordestino no estado. Para o Rio, a partir da década de 1930, migraram os sertanejos acima da Bahia, e ficaram conhecidos como “paraíbas”.

Em São Paulo, a chegada dos nordestinos desencadeou tensões na classe operária. Houve disputa pelos postos de trabalho com os imigrantes estrangeiros, trazidos pela política de “branqueamento” do estado. Segundo o historiador, contribui para o preconceito a construção da imagem do Nordeste flagelado, miserável, atrasado e ignorante feita pela própria elite da região para obter recursos e cargos diante do crescimento do Centro-Sul. “Só que essa realidade vem se transformando e muita gente não viu. Está cada vez mais defasada, só existe em termos de estereótipo. O político nordestino quando faz algo errado ainda é chamado de ‘coronel’, mas não ocorre o mesmo quando vem do Sul ou do Sudeste.”

Latente, o preconceito vem à tona quando estimulado. E parece ser mais regional que partidário. Tome-se o caso dos dois Grazianos, Xico (tucano) e José (petista). Ambos paulistas. O tucano usou o Twitter para alfinetar o companheiro de partido Aécio Neves em virtude da vitória, segundo ele, “nordestina” de Dilma em Minas Gerais. Já o petista José causou polêmica no começo do governo Lula. À época ministro da Segurança Alimentar, declarou sobre o Nordeste: “Temos de criar emprego lá, temos de gerar oportunidade de educação lá, temos de gerar cidadania lá. Porque, se eles continuarem vindo pra cá, vamos ter de continuar andando de carro blindado”.

Mas será que se um partido assumisse esse discurso segregacionista teria futuro no País? Não assumidamente, mas sub-repticiamente é possível que sim. Há um ano, o diretor do instituto Vox Populi, João Francisco Meira, compila dados que apontam para um vácuo: falta um partido assumidamente de direita no Brasil. De acordo com Meira, nenhuma das legendas existentes, inclusive o DEM, se declara. “Há condições para o crescimento da direita. A campanha do Serra, nesta eleição, explorou esse espaço e o resultado final das eleições mostrou que ele é relevante.”

O diretor do Vox afirma que metade dos votos recebidos por Marina Silva, do PV, no primeiro turno, era de direita, conservador. E foram exatamente esses votos que foram para o tucano no segundo turno. “O Serra conseguiu captar todo o voto conservador da Marina. Isso rendeu a ele um terço a mais de votos do que teve no primeiro turno”, diz Meira.

A professora de Ciência Política da Universidade de Brasília, Lúcia Avelar atenta para o fato de essa guinada à direita de uma parcela do eleitorado representar uma reação à mobilidade social propiciada pelo governo Lula. “Como havia uma distância muito grande entre as classes, é como se pensassem: ‘Puxa, eles estão se aproximando. Vão sentar ao nosso lado no cinema, no teatro’. Mexer no status quo incomoda muita gente.”

Para se inserir de vez no contexto conservador que ensaiou nesta eleição, Serra enfrentará obstáculos dentro do seu partido, o PSDB. Seria temerário dizer que existe uma tendência direitista dentro do tucanato como um todo: Aécio Neves, por exemplo, está mais identificado com o centro, assim como Teotônio Vilela, governador reeleito de Alagoas. Uma alternativa para este novo Serra seria fundar outra legenda, que absorvesse setores do PSDB, DEM e dos demais partidos conservadores, como o PP. Ou esperar uma saída de Aécio da legenda, que levaria a ala não paulista do partido consigo e abriria espaço para uma hegemonia do ex-governador de São Paulo.

A eleição de Felipe Calderón no México, em 2006, e, mais recentemente, de Sebastián Piñera no Chile, comprova que existe espaço para uma direita não golpista na América Latina. De qualquer forma, parte da oposição brasileira parece encantada com o estilo neocon dos republicanos. Do ponto de vista eleitoral, não se pode negar, ela deu resultados – e no curto prazo. Como se verá na reportagem de Antônio Luiz M. C. da Costa à pág. 58, Obama sofreu uma derrota fragorosa nas eleições legislativas, a maior de um partido governista nos Estados Unidos desde o fim dos anos 1930. Uma das razões deve-se à campanha republicana permanente, iniciada logo após a vitória de Obama, e baseada em preconceitos e mentiras. Velhos temores da Guerra Fria (Obama seria “comunista”) misturam-se a novos (ele seria a favor do Islã). Resultado: presos a uma pauta moralista e insatisfeitos com o resultado de uma política econômica aprofundada sobre o mandato do antecessor Bush, os norte-americanos não conseguem debater temas realmente cruciais ao seu futuro.

Parece ser essa a diferença entre uma velha direita, liberal e centrada na defesa das liberdades individuais contra um suposto Estado opressor, e a atual. Ao redor do mundo, quem ganha espaço entre os conservadores são partidos defensores da xenofobia, do racismo e do obscurantismo religioso.

No fim das contas, tenha ou não sido proposital, essa foi a cara da campanha de Serra no segundo turno, pois nem o racionalismo econômico pôde lhe ser atribuído, vide as propostas de reajuste do salário mínimo a 600 reais e o 13º para os beneficiários do Bolsa Família (ironicamente atacados pelos eleitores tucanos na odiosa campanha na internet). No seu discurso na noite do domingo 31, o ex-governador paulista diz ter dado um “até logo, não um adeus”. Para quem tanto defendeu sua biografia na disputa presidencial, Serra poderia voltar à cena como defensor intransigente dos valores democráticos que ele tanto diz prezar. O Brasil agradeceria.

Juiz é afastado por preconceito (de inspiração religiosa)

Via http://www.terra.com.br/

CNJ afasta juiz que chamou Lei Maria da Penha de "diabólica"

Por nove votos a seis, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) decidiu nesta terça-feira afastar um juiz de Sete Lagoas (MG) de suas atividades que considerou inconstitucional a Lei Maria da Penha em diversas ações contra homens que agrediram suas companheiras. Edilson Rumbelsperger Rodrigues alegava que a legislação reunia "um conjunto de regras diabólicas" e que "a desgraça humana começou por causa da mulher". O grupo que votou a favor do afastamento do juiz entendeu que ele usou em suas decisões uma linguagem discriminatória e preconceituosa.

O afastamento do juiz está previsto na Lei Orgânica da Magistratura, que considera "grave" a atitude de um magistrado. Porém, não o leva a aposentadoria compulsória. Rodrigues receberá salário proporcional ao tempo de serviço e poderá pleitear o retorno ao trabalho após dois anos de afastamento.

Em nota divulgada para sua defesa, Rodrigues disse que não ofendeu ninguém, apenas se posicionou contra a legislação "em tese".

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

O que esperar de uma mulher na Presidência?

Autora: Maíra Kubik Mano

http://viva.mulher.blog.uol.com.br/

Ao que tudo indica – a não ser que os institutos de pesquisa estejam redondamente enganados – o Brasil terá, a partir de janeiro de 2011, uma mulher na Presidência da República.

Uma mulher!

É verdade que três mulheres já haviam nos governado antes: D. Maria I (à distância, ainda como rainha de Portugal), Maria Leopoldina (esposa de D. Pedro I) e a Princesa Isabel. Mas, com exceção de D. Maria I, as outras duas funcionaram apenas como "tapa-buracos" – sim, eu sei, uma delas assinou a abolição da escravatura, mas ainda assim... E, obviamente, todas vinham da Família Real portuguesa, uma referência cada vez mais longínqua na nossa história.

Dilma Rousseff será a primeira mulher eleita pelo povo para dirigir o Brasil. Simbolicamente esse é um fato incrível, independente de sua matiz ideológica. Em especial se considerarmos o quanto as mulheres seguem sub-representadas na política nacional: nessa última legislatura, éramos apenas 8,97% da Câmara Federal e 12,34% no Senado, número que caiu em 2010. Aliás, se nossa base de cálculo fosse essa, eu arriscaria afirmar que demoraríamos mais uns cem anos para ver a cena que ocorre hoje.

Dito isso, é preciso ter em conta que a eleição de Dilma não é sinônimo de termos um governo que apóie pautas feministas. Já teci longos comentários aqui sobre a masculinização da política e como muitas mulheres se comportam como homens para poder chegar ao topo. Dilma não é diferente. Tanto que sofreu com muitos boatos cruéis e "acusações" sobre sua sexualidade como reações ao endurecimento de postura.

Vale lembrar que a candidata também não tem tradição de militância no campo de gênero, diferentemente de seu partido, o PT. E, além de não ter um olhar mais aguçado para esse tema, sua campanha eleitoral não deixou dúvidas sobre os parâmetros dos quais vai partir o novo governo: os da família, no molde mais tradicional e opressor possível. Basta lembrarmos que Dilma ressaltou seu papel de mãe (e avó) em contraposição à legalização do aborto, ainda que tenha dito que não deixaria mulheres que precisassem de curetagem morrer na porta dos hospitais do SUS (Sistema Único de Saúde).

Na verdade, se pensarmos no quão conservador se tornou o debate em torno dessa questão, não seria exagero dizer que o cenário piorou para as pautas historicamente ligadas ao feminismo. E, para além de ações isoladas, principalmente da Secretaria de Políticas para as Mulheres, o governo Dilma dificilmente contribuirá para reverter isso.

Resta torcer (e pressionar) para que alguns ventos dos pampas e da Cordilheira a inspirem, arejando a cena política brasileira. Dilma será a terceira mulher presidente na América do Sul e seria bom se, em alguns pontos, ela seguisse o exemplo de suas correlatas. Michelle Bachelet, ex-mandatária chilena e atual diretora da ONU Mulher, nomeou 50% de mulheres em seu gabinete quando presidente – medida tomada também pelo boliviano Evo Morales. Já a argentina Cristina Kirchner não só aprovou o matrimônio gay como deixa o país a um passo de descriminalizar o aborto.

É, pensando bem, talvez um vento seja pouco para o que foi essa onda terrível que assistimos no segundo turno. Esperemos, então, por um tsunami político para mudar o rumo das coisas.

Brasileira pede excomunhão

Via http://viva.mulher.blog.uol.com.br/

À Sua Santidade Papa Bento XVI

00120 Via del Pellegrino

Citta del Vaticano

Pedido de excomunhão
# São Paulo, 29/10/2010

Prezadas autoridades eclesiais,

Eu, Maíra Kubík Mano, cidadã brasileira, 28 anos, venho, por meio desta, solicitar à Igreja Católica Apostólica Romana minha excomunhão.

Fui batizada involuntariamente, quando tinha poucos meses de vida, pelos meus pais. Eles nada mais fizeram do que seguir a tradição de seus antepassados e não pretendo nem vou responsabilizá-los por isso.

Contudo, aos 9 anos, fui de livre e espontânea vontade tomar a comunhão (Eucaristia). Fiz o curso necessário para tanto na Igreja Nossa Senhora do Brasil, em São Paulo, SP, Brasil. Durante nove meses, aprendi os preceitos católicos e estudei passagens bíblicas. Em seguida, participei da cerimônia em que recebi, pela primeira vez, a hóstia, ou o corpo de Cristo.

Desde então, fui à missa poucas vezes e, com o passar do tempo, identifiquei-me cada vez menos com a doutrina católica. Ou, melhor dizendo, com aquela pregada diretamente pelo Vaticano.

É preciso aqui fazer uns parênteses para afirmar que tenho, isso sim, laços fortes com a chamada Teologia da Libertação, que inundou de solidariedade e compromissos sociais os rincões do Brasil na segunda metade do século XX. Mas com esse grupo, imagino, você não está preocupado. Conseguiu isolá-lo, desautorizá-lo, diminuí-lo. Porém, quero registrar aqui que não foi possível enterrá-lo. O exemplo de sua força segue vivo com D. Pedro Casaldáliga, Dom Tomás Balduíno e tantos outros.

De qualquer forma, cheguei à conclusão de que tenho um desacordo absoluto e completo com Sua Santidade, sem possibilidade de repactuação. Entre os pontos mais prementes sobre os quais temos visões diametralmente opostas estão legalização do aborto, casamento gay e utilização de preservativos durante o ato sexual. Isso só para começar a conversa. Poderia discorrer páginas e mais páginas sobre o lugar subalterno e humilhante que vocês têm reservado às mulheres durante séculos a fio.

A gota d'água que me levou a redigir essa carta foi a orientação de Vossa Senhoria para que os pastores orientassem politicamente seus fiéis com base em preceitos morais, tendo em vista a eleição para a Presidência da República que ocorre no próximo domingo (31/10/2010). Bem, para mim o único preceito válido é o do Estado laico e considero um absurdo completo a Igreja se pronunciar sobre isso. Religião e governo misturados é uma fórmula maléfica, que prejudica as liberdades individuais e coletivas.

E, como se tudo isso não fosse suficiente, atualmente eu me defino como atéia.

Sendo assim, peço que Sua Santidade seja sensível o suficiente para compreender que eu não quero mais ser considerada uma parte deste rebanho. Nem oficialmente, nem extra-oficialmente, e me conceda a excomunhão.

Obrigada desde já,

Maíra Kubík Mano